AGRICULTURA PURA, VONTADE E SENTIMENTO

É uma verdade que o solo e as plantas possuem a sua própria vontade e sentimento. Isto é algo de grande importância, sobre o qual devemos meditar profundamente. Por este motivo, devemos amar e respeitar a terra e é essencial fazermos o máximo possível para não maculá-la.

No que se refere a esta vontade e sentimento, o nosso nível de consciência é igual ao dos animais. Se alguém joga fezes ou drogas na sua cabeça, você se sentiria ofendido, ficaria histérico de raiva. Atualmente todo o solo do Japão está com raiva do homem, que não consegue produzir alimentos suficientes, porque a terra está em plena greve.

Por exemplo, a planta do arroz tem vontade de se alimentar da parte saborosa da terra, mas o homem joga coisas fedorentas nela. Portanto, o arroz se sente profundamente ofendido. Além disso, o homem obriga a planta a se alimentar de coisas estranhas e ela acaba enfraquecida por falta de nutrição. Por esta razão, toda planta de arroz cultivada em terra adubada é magra e pálida.

Isto fica bastante claro se compararmos a planta de arroz com o homem. Assim como o homem enfraquece a sua vitalidade se ingerir muitos medicamentos, a planta de arroz, se ingerir muitos adubos e agrotóxicos, também se enfraquece cada vez mais. Qualquer tempestade ou praga nociva a derruba.

A atitude do ser humano pode ser resumida numa só palavra: “Uma tolice sem fim!” Certa vez falei no kanku[1] “Você é tolo! Mas, pensando bem, o tolo sou eu!” Isto se aplica a todos os japoneses.

É essencial olhar e pensar desta maneira sobre as plantas. Ao meditar seriamente sobre este aspecto, a pessoa sente receio e até temor de jogar adubo sobre a terra, deixando, por fim, de jogar qualquer coisa sobre ela. O homem despreza as plantas porque não percebe que as plantas e até os objetos inorgânicos têm a sua própria vontade e sentimento. Como consequência disto, muitas vezes as árvores e flores secam e, se não chegam a morrer, perdem a sua vitalidade.

As árvores da calçada normalmente não agradam nossos olhares, são muito sem graça. Mas, quando o dono das árvores as aprecia muito, as ama e as trata com bastante carinho, elas se esforçam para agradar o dono, procurando tornar-se as mais belas possíveis para ele. Por isso, existe uma grande diferença entre estas árvores.

As pessoas que visitam a minha casa elogiam as árvores e as flores do jardim. Falam que é bem diferente dos outros jardins. Acontece que aprecio muito as plantas e flores, estou sempre olhando para elas com bastante amor. Por isso elas também querem mostrar a sua beleza o máximo possível.

Isto é realmente muito misterioso. Estou sempre fazendo arranjos de flores e, às vezes, não fico muito satisfeito com o que fiz, mas deixo assim mesmo. No dia seguinte, a planta ajeitou os seus galhos, ficando muito mais bonita. É por isso que digo que as flores estão vivas.

O mesmo ocorre com as árvores. Quando se corta os galhos ou se planta as árvores “de lado” ou “de costas”, os galhos que ficam do lado que são vistos e apreciados crescem mais, tomando uma forma maravilhosa. É realmente um mistério! Quando se observa atentamente, o lado que as pessoas olham na árvore pouco a pouco se desenvolve e cresce mais. E o lado que não é visto pelo homem fica feio.

Através deste fato, podemos observar que elas estão procurando mostrar a sua melhor forma, a sua parte mais bela.

É tão bom saber que todas as coisas, até mesmo inorgânicas, têm vida. Tendo espírito, a reação dela é sempre diferente e isto depende do tratamento, da maneira de se olhar e de se amar.

Mesmo para objetos como este bowl[2] de cerâmica, se alguém está sempre amando-o, a sua beleza muda. É por esta razão que as pessoas gostam de antiguidades porque, ao longo do tempo, muitas pessoas apreciaram e amaram estes objetos. Criou-se nelas, então, um azi [3].

Os bowls antigos possuem uma beleza profunda e interessante, um aziwai [4]. Isto porque penetrou-se neles o espírito de muitas pessoas. Por isso, uma obra de arte nova, mesmo que de grande valor, não tem aziwai.

As plantas agrícolas e as flores apresentam uma diferença muito grande, dependendo das pessoas que as tratam e as apreciam. Não existe lógica de que estas plantas melhorem ao se jogar fezes ou esterco animal sobre elas.

A essência da agricultura pura está nesta verdade. Os espíritos do Fogo, da Água e da Terra se fundem numa só energia. Esta energia, esta força, é o verdadeiro adubo. A terra é matéria, mas, dentro dela, sopram o Espírito da trindade do Fogo, da Água e da Terra, tudo controlado pela Grande Natureza.

Este sopro do espírito pode ser mais denso ou mais fraco, dependendo do amor do ser humano. Se tratarmos a terra com amor e não a macularmos, este torna-se mais forte, mais denso. Isto é adubo!

O adubo verdadeiro é invisível. Portanto, a ciência não consegue desvendá-lo, mesmo pesquisando muito. Ao contrário, a ciência atrapalha a formação do verdadeiro adubo até que a terra abençoada por Deus se torne imprestável.·

 16 de janeiro de 1954


[1]kanku: frase curta que expressa a verdade de forma irônica, provocando riso.

[2]bowl: é uma tigela normalmente usada para cerimônia de chá. O chá utilizado é o chá verde, feito de folhas moídas em pó.

[3] azi: significa sabor. Principalmente os apreciadores de obras orientais usam esta palavra para descrever um tipo de beleza que esta obra produziu ao longo do tempo, através da apreciação e amor de muitos admiradores da obra.

[4]aziwai: adjetivo de azi.